terça-feira, 15 de novembro de 2016

Convento do Desagravo do Santíssimo Sacramento de Vila Pouca da Beira


      Historicamente, os dados que tenho figura-me uma certeza significativa dada há pouca atenção da época e aos redigidos de uma letra uniforme, da mesma mão, cronologicamente muito pouco precisa, com poucos dados referidos…
     Acidez, repasse de tinta e folhas destacadas de algumas encadernações truncadas e também rasgadas com omissão de texto, prejudica a leitura.

      Tendo alguns escritores supostamente terem feito a sua história para melhor defenderam os seus interesses… a deixarem em causa algumas controvérsias. A época a que correspondem estes acontecimentos é profundamente marcada por constantes revoltas com pouca ou nenhuma autoridade. Alguns conteúdos por mim lidos estão significativamente comprometidos deixando-me entre o mito e a realidade quando as vicissitudes históricas põem apenas hipóteses… por não termos conhecimentos subsequentes. 







     Diz-nos a história: 
Vila Pouca da Beira foi o local escolhido para erguer uma casa conventual, cuja invocação foi muito difundida na centúria de Setecentos. As razões para a escolha deste lugar de implantação, terão sido «a beleza do sítio, a amenidade dos ares, a abundância de água, a abundante vegetação, a fauna e flora paradisíacas e, o esplendor de uma desafogada paisagem» - opinião vista Bispo Conde de Coimbra, D. Francisco Lemos de Faria Pereira, Coutinho, testemunhada pela descrição arquivística e inventário espólio documental do cartório da Mitra Episcopal de Coimbra.

                                       Vila Pouca da Beira 


      Povoação Vila Pouca da Beira recebe a carta de foral atribuída a 20 de Dezembro de 1519 pelo rei D. Manuel I, já com tradição religiosa com a referida a existência da primitiva «ermida de S. José, sob um largo com um pelourinho, a escassa centena de metros num pequeno cabeço isolado, sobre a colina fronteira ao rio Alva». Foi possivelmente demolida ou incluída numa das dependências da singela arquitectura do convento. 
     A primitiva ermida de S. José com vicissitudes desconhecidas, ao fim de algum tempo, a fim de prover as necessidades de espaço para a comunidade monástica alargou-se o edifício até á construção vigente?
As construções começavam com um pequeno templo de nave única, preparada para poder de futuro ser refeita.
O desenvolvimento das povoações fazia com que se alargassem os locais de culto. Construída uma capela, acrescentava-se uma nova dependência á velha construção.

     Vila Pouca da Beira, foi vila e sede de concelho até ao início do século XIX, constituída apenas pela freguesia da sede com uma população 402 habitantes em 1801, depois, acabou por ser anexada ao concelho de Avô, e que hoje, são duas freguesias do conselho de Oliveira do Hospital. Vila Pouca da Beira em 1848 tinha 3000 pessoas, tendo hoje menos que no começo do seculo XIX.

   A mitra de Coimbra possuía o privilégio de jurisdição cível e crime em diversos coutos do bispado de Coimbra, como Arganil, Avô, Barrô, Candosa, Coja, Lourosa, Midões, Santa Comba Dão, etc., nos quais nomeava juízes, ouvidores, meirinhos, alcaides, inquiridores, escrivães e tabeliães. Eram os juízes dos seus coutos e vilas que dirimiam todas as questões judiciais, mas em Coimbra as decisões eram tomadas no Auditório ou Relação Eclesiástica.



      Convento do Desagravo da Villa Pouca da Beira começa a ser erguido no último quartel do século XVIII. A licença de construção refere: Convento de Desagravo do Santíssimo Sacramento de Vila Pouca da Beira, concedido pelo Bispo Conde de Coimbra, D. Francisco Lemos de Faria Pereira, Coutinho, (1735 — 1822) a 19 de Agosto de 1780, conforme a Provisão Régia e Episcopal, - como proprietário, era quem podia autorizar as instituições monásticas na Beira.
     Seguindo todas as fontes coevas, com a morte de D. Francisco Lemos de Faria Pereira, Coutinho, sucede-lhe o Patriarca de Lisboa Francisco de São Luís Saraiva, que levou a construção do «Convento do Desagravo a estar apto a ser habitado onze anos mais tarde do começo da sua construção, embora não totalmente concluído, apenas faltando a finalização de pequenos trabalhos.» O que leva a crer depois de consultar alguns documentos, que o convento estaria habitado entre finais de 1800 e 1801, a ultima data está gravada em um dos sinos. O ponto final da construção exibe-se na data 1817 de um segundo sino.

      Uma segunda versão: “A construção deverá ter começado a ser construído por volta de 1780 e ter ficado pronta cerca de 1800, quando chegaram “duas irmãs clarissas do convento do Louriçal, alojadas no hospício, parte do edifício já acabada.”

       Provisão Régia e Episcopal citam que, o convento estava sobre a alçada do ordenamento do administrador da concelhia local, vivendo com as esmolas do povo, da semeadura dos seus terrenos e das dotações da nobreza de Vila Pouca da Beira.

     Os eclesiásticos nos séculos anteriores tinham o hábito de rasurar nos documentos as palavras e entrelinhar um duplo sentido de interpretação complexa como hospício, recolhimento, - que possivelmente queria dizer casa de hóspedes. O hospício do Convento do Desagravo de Vila Pouca da Beira dava guarida temporária ao Bispo-conde de Coimbra e recebeu titulares de dioceses. 

Existe a versão lendária de que a verdadeira criadora do convento: 

      «Mulher analfabeta do povo, fundadora e dinamizadora, “Soror” Genoveva Maria do Espírito Santo, falecida a 31 de Dezembro de 1821. Recolheu esmolas, não só no país como na corte no Brasil recebendo jóias das mãos da Rainha D. Carlota Joaquina, e que ambas comprovam em documentos escritos, e da mesma forma.» - Sem que se refira quais as fontes e onde se encontram.». Cria-se aqui uma confusão com a aia de D. Pedro IV, D. Maria Genoveva do Rêgo e Matos, irmã de D. Maria Constância do Rêgo Matos, sendo o único nome mais parecido.
     A lenda de Genoveva Maria do Espírito Santo, não tem qualquer credibilidade. Os transportes eram lentos, e dispendiosos para qualquer pessoa da classe media baixa. Só os homens bem renumerados, comerciantes empresários ou titulares hierárquicos podiam dar-se ao luxo de sair de casa para qualquer ponto distante do país. Dificilmente senão impossível uma mulher do povo analfabeta atravessar o oceano duas vezes, a não ser que fosse criada da realeza. Que partiram em 1808 e regressaram em 1821, quando o convento já estava edificado. As viagens por mar ao Brasil, lisboa, Rio de Janeiro levavam quatro a cinco meses. As doenças a bordo faziam transtornos de toda a ordem. Os infectados a bordo duravam pouco e eram sepultados no oceano.
     Canonicamente descreve-se uma lenda em que as abadessas fundadoras são, Soror Maria do Lado e Soror Maria Barbara, mas a primeira simplesmente foi a verdadeira inspiradora do convento do Louriçal(1), e faleceu em 1632, já teria sido estigmatizada um pouco antes de morrer, fora considerada prelada perpétua e venerável desde 1720. Soror Maria Barbara viria a ser abadessa, que tomara a direcção do convento do Desagravo do Santíssimo Sacramento de Vila Pouca da Beira com freiras clarissas em “compromisso perpétuo”, que implicava os votos de obediência, pobreza, castidade e clausura. A ordem religiosa deu grande contributo para o desenvolvimento da região. 


(1)        -As irmãs clarissas do Louriçal pertencem a uma Congregação fundada em 1631 e que, posteriormente, foi agregada à Segunda Ordem Franciscana (Ordem de Santa Clara), em 1709, tomando a designação de Clarissas do Desagravo.







     A presença das freiras clarissas fizeram crescer vários aglomerados populacionais que em seu redor fixaram residência, e mais tarde se tornarem freguesias.
     A falta de crescimento populacional fez com que migrassem de zonas mais povoadas para locais de fraca demografia. O número de mortes superava todos os anos em mais de metade das crianças falecidas. A mortalidade, quer adulta, quer infantil, ficou a dever-se à trilogia da fome, da peste, doenças sazonais e por final das guerras. O número elevado de mortos estava entre as camadas mais pobres, que faleciam em palheiros com condições degradantes e desumanas. 

                                    A invasão Francesa

     A invasão Francesa a Portugal a 15 de Setembro de 1810 pela Beira, com o objectivo de alcançar rapidamente Lisboa através de Coimbra, acabou por sacrificar o Convento do Desagravo do Santíssimo Sacramento de Vila Pouca da Beira. O exército francês mais numeroso das três invasões francesas a Portugal com um efectivo total de 65.050 homens, oficia, sargentos e soldados, comandados pelo general Massena, que contava unidades de apoio dos desertores portugueses, Pedro Almeida, Marquês de Alorna e muitos outros exilados que optaram por ficar em França.  

     Convento do Desagravo resistiu à fúria das invasões francesas, e mais tarde das leis liberais que ditaram o encerramento dos conventos.

 A extinção das ordens religiosas em 1834

    As Cortes Constituintes do reinado de D. João VI por Decreto de 18 de Outubro de 1822, proíbe a admissão de noviços nos conventos e reduz as casas conventuais. Essas determinações foram suspensas depois da contra-revolução de 1823, mas não "saiu do espírito dos liberais a ideia de executarem uma nova reforma eclesiástica de futuro a seu modo".
     A contra-revolução ao movimento político português de 1820 começa, por assim dizer, no próprio momento em que se dá o levantamento do Porto de 24 de Agosto, vai crescendo no decorrer do processo revolucionário e tem o seu momento vitoriosono golpe da Vilafrancada, ocorrido em 27 de Maio de 1823.
     1834 - Surge o decreto de extinção das Ordens Religiosas pelo Ministro da Justiça, Joaquim António de Aguiar, que redigiu o texto do Decreto assinado por Pedro IV de Portugal, foi publicado em 30 de maio de 1834. Por esse diploma, eram declarados extintos todos os conventos, mosteiros, colégios, hospícios, e quaisquer outras casas das ordens religiosas sendo os seus bens secularizados e incorporados à Fazenda Nacional, à excepção dos vasos sagrados e paramentos que seriam entregues aos ordinários das dioceses.
     O diploma afirma ainda que seria concedida uma pensão anual aos religiosos que não obtivessem benefício ou emprego público o que nunca veio acontecer Esta lei valeu a António de Aguiar o apelido de "Mata Frades". 
     Todas as instalações conventuais do país foram sucessivamente ocupadas pelos mais diversos serviços e organizações do estado ou foram vendidas à semelhança de tantas outras restantes em hasta pública.
 Quanto às ordens religiosas femininas continuaram a existir sem poderem admitir noviças. Ficando assente em 1862, que os conventos e mosteiros femininos seriam extintos por óbito da última religiosa, sendo os bens da instituição incorporados na Fazenda Nacional.


     A extinção das ordens religiosas em 1834 veio interromper a vida conventual da ordem das irmãs Clarissas, mas a instituição permaneceu até que embora a última freira faleceu em 1889, data em que o convento foi de facto encerrado.
 




 Cronologia Da utilização das instalações do Convento

1889 – A 20 de Julho faleceu a ultima religiosa do convento de Vila Pouca, depois as instalações de uma parte do convento foram adaptados e ampliados para hospital para fazer face á doença da tuberculose com o empenhamento da Rainha D. Amélia, do seu médico D. António de Lencastre e doutor Sousa Martins, ficando o Doutor, Lopo de Carvalho, responsável pelos centros onde residiam ou estabeleciam doentes, praticando a chamada cura livre – vivência em clima de montanha, sem acompanhamento médico regular.

1928 A 1935 - Encontrava-se instalado o Posto Agrário do Mondego, extinto em 1935. Estava destinado a promover o aperfeiçoamento e os processos de cultura. O emprego das adubações e seleccionar sementes. Ensino do processo adequado para produção de cereais.
 
1935- Arrendado às religiosas Doroteias, que ali se instalaram em 1936 um colégio, encerrando o mesmo em 1939, e deixado a vila a 13 de Dezembro do mesmo ano. Dois anos mais tarde, o edifício é aberto e documenta-se num livro da diocese de Coimbra que, o Convento do Desagravo do Santíssimo Sacramento de Vila Pouca da Beira encontra-se muito desagradado, sem condições para habitar.

1942 – O convento recebeu obras de sustentação. As obras centraram-se na implantação de uma estrutura de protecção das águas da chuva, consolidação da estrutura principal do edifício e cobertura de paredes expostas aos elementos. Toda a zona envolvente foi alvo de regulares intervenções ao nível da limpeza dos terrenos e arranjo dos seus acessos. Depois das reparações, estiveram em trânsito um grupo de irmãs Dominicanas, após realizarem o noviciado no Mosteiro de Prouille, França, para expressarem a misericórdia e a compaixão para com a humanidade com gestos de solidariedade e na educação. Permaneceram pouco tempo, esperando serem colocadas na Casa de S. Domingos do Santíssimo Rosário, em Fátima, ainda em construção, onde permaneceu até 1984, que foi transferida novamente para a Casa de S. José, Quinta do Ramalhão, em Sintra.   
 1952 – Instala-se a Junta Geral da Província da Beira, com o código Administrativo desde 1836: Juntas Gerais de Distrito - órgãos de administração regional do território, desenvolviam actividades de assistência infantil, hospital, e colonia de férias “Ar e Sol”. Bissaya Barreto tomou posse como presidente da Junta Geral do Distrito de Coimbra em 1927, dando continuidade às obras antituberculosa, protecção às grávidas e, defesa das crianças, até 1959, quando o Código Administrativo das províncias foram extintas como autarquias e, substituídas pelos distritos, que passaram a dispor de dois órgãos: o Conselho de Distrito, formado por procuradores de cada um dos municípios do respectivo distrito, e a Junta Distrital, eleita pelo Conselho.
1959- Quanto às informações superficiais sabemos, que inicialmente o espaço emblemático do convento parcialmente utilizado como hospício, passa a ser utilizado para prestar serviços de carácter social, mas ligado à assistência infantil da Fundação Bissaya Barreto, constituída em 1958 com um património inicial de 1.200 contos de réis, inscrito pelo patrono, acrescentando um valioso património imobiliário (urbano e rústico) localizado em diversos concelhos da região do centro do país.
1975 A 1983 serviu de alojamento de algumas famílias desalojadas das antigas colonias.
     2000 – Depois colonia de férias para crianças, pautou-se pela adaptação do mesmo a uma unidade hoteleira, como nos é apresentada nos dias de hoje.
     Fundação Bissaya Barreto inicia obras de recuperação e de adaptação de convento a unidade hoteleira, actualmente com todo o espaço revitalizado a funcionar como pousada a partir de Julho do ano 2000. - Integrada no conjunto das Pousadas de Portugal.