sábado, 8 de julho de 2023

A Palmatória

 Retirado do Correio de Coimbra 

 A palmatória foi o mais importante instrumento punitivo usado pelos veteranos da Universidade de Coimbra até à Revolução de 1910. Intimamente associada às imagens disciplinares do ensino da gramática e primeiras letras pelos mestres, a chibata e a palmatória em formato de espátula ocorrem na iconografia medieval como símbolos de um dos saberes do Trivium, a Grammatica, ministrada nas Faculdades de Artes Liberais. As palmatória primitiva seriam em formato de espátula, com ou sem furos, algo próximas das espadelas do linho que em Portugal sobreviveram até ao século XX.

     O ensino à base da memorização, disciplina e obediência à autoridade do mestre ficou longamente associada aos colégios da Companhia de Jesus, onde se usava a palmatória, estabelecimentos abolidos pelo Marquês de Pombal em 1759.

      Este instrumento disciplinar esteve em uso em Portugal nas escolas de instrução primária, colégios e seminários católicos até meados do século XX. Conhecida na gíria escolar por “Santa Luzia” e “Menina dos Cinco Olhos”, a palmatória apresentava cabo curto trabalhado em torno de marceneiro e pá circular com cinco perfurações (José Leite de Vasconcelos, Etnografia Portuguesa, VIII, 1982, p. 505). Era chamada “Santa Luzia”, uma vez que a sua forma lembrava a bandeja onde Santa Luzia exibia ante os crentes os olhos que lhe haviam sido arrancados no martírio.

     A palmatória é abundantemente referida na literatura coimbrã      Até 1910  e aqui e ali nos processos disciplinares da Polícia Académica como o instrumento mais utilizado na aplicação de palmatoadas, boladas ou “bolas” nas palmas das mãos. Palmatórias havia que tinham uma face coberta de couro e outra esculpida. Os furos funcionavam como ventosas e formavam bolhas e hematomas nos sítios onde a pá fustigava a pele.

      Nos museus ligados à instrução primária portuguesa existem exemplares de palmatórias. No Museu Académico de Coimbra encontra-se uma que pertenceu ao estudante Antero de Quental e que lhe valeu em 1859 oito dias de prisão, pois que sendo o mesmo Antero aluno do primeiro ano de Direito andou na noite de 20.04.1959 com outros colegas dando praxe a um aluno liceu, para mais embuçados nas capas e munidos de tesouras, palmatórias e cacetes (Ana Maria Almeida Martins, Antero de Quental, 1986, pp.70-72; Mário Brandão, Antero de Quental estudante, Coimbra, 1957).

Sem comentários:

Enviar um comentário