quinta-feira, 27 de junho de 2013

Tradução de textos - D. Francisca de Aragão.-







D. Francisca de Aragão.

     D. Francisca de Aragão, (1525 – 1615) dama preferida da rainha D. Catarina da Áustria, mulher do rei D. João III, cheia de devoção, mas muito atormentada pelas práticas da inquisição encantara-se com o espirito, e vividez de D. Francisca. A dama que veio de moça do Algarve para o paço da Ribeira com outras jovens da sua família.
     Francisca, filha de Nuno Rodrigues Barreto, senhor da Quarteira e de D. Leonor Milan, filha de Afonso, mestre de calatrava e filho bastardo de D. João II de Aragão. Gente com sangue real, que se veio a justificar mais tarde pelo tratamento de sobrinha, por parte de d. Filipe III de Castela.
Francisca 6º filha entre sete irmãos, e sobrinha do famoso governador da Índia Francisco Barreto entre 1555-1558. – Segundo diz os investigadores contemporâneos.


     D. Nuno Rodrigues Barreto, alcaide-mor, de Faro e Loulé, fronteiro-mor, vedor da fazenda de toda a província algarvia.
Francisca, uma das mais lindas mulheres, entre as celebradas formusuras da corte, musa inspiradora de vários poetas, entre eles, Luiz Vaz de Camões, Andrade Caminha, do seu amante D. Manuel de Portugal, e de João Borja, com quem veio a casar pelo seu prestígio de embaixador em Portugal, homem com grandes serviços prestados a Castela, que veio a ser reconhecido por mérito, e a fez ser a primeira condessa de Ficalho.
E pelo que se diz, sempre foi uma mulher atiçada. «Da união com D. Juan de Borja e Castro ( Bellpuig , 1533 - El Escorial , 3 de Setembro de 1606 ).    tiveram  dez filhos, todos ilustres, com os seus nomes e brilho no seu brasão familiar.»

     D. Juan esteve ao serviço de Filipe II de Espanha. Veio para Portugal em 1569, como embaixador para mediar o casamento de D. Sebastião com Margarida de Valois (que nunca aconteceu) e para tentar dissuadir o rei Português de empreender sua planejada expedição África.
- Podemos aperceber que as senhoras da nobreza, inteligentes, cultas e atraentes, aproveitaram todas as oportunidades da vida nas suas épocas, e D. Francisca viveu na mais lustrosa da história de Portugal. A grande certeza está em D. Francisca de Aragão aparecer solteira ao lado de D. Catarina entre os grandes vultos da corte, sem que qualquer contexto tradicional de ser a mais cortejada das damas a destroçar corações. 
     - Titulo extinguido em 1692 com a morte do bisneto de D. Francisca de Aragão, sem descendência do 4.º conde.D. Carlos de Aragón Borja Alagón y Gurrea (1634 – 1692), 9.º duque de Villahermosa e 9.º conde de Sástago (títulos espanhóis)

    
     D. Manuel de Portugal viveu com D. Francisca uma romântica exaltação de homem apaixonado, como nunca tinha acontecido com as suas três esposas. Segundo Dizem as cronicas do conde de Sabugosa: «estonteou-se pela sua figura num lugar à parte, fora de todas as outras suas amantes.»
     Os historiadores recordam-na como amante de D. Manuel I, mulher muito assediada, vindo a ser esposa de D. Juan de Borja, e mãe de homens famosos na história: príncipe de Esquilache, o duque de Villahermosa, e D. Fernando de Borja y Aragón, comendador da Ordem de Montesa.


      Menciona-se na sua biografia as suas inclinações poéticas, e que se dedicara a fazer versos e organizar concertos e peças teatrais.
Manuel de Faria e Sousa, veio indicar que pelas escritas por si inspeccionadas, uma epístola em tercetos é dirigida ao rei D. Manuel I, que tem nela a autoria mais provável. Que faz passar um conteúdo de temáticos da voz masculina com razões muito convincentes, mas mais se parece com o género feminino como tantos outros cancioneiros que escreveu como anónima.  





                          FRANCISCA DE ARAGÓN
                                  Pues aquel gran amor que me tubiste
holgaste de mudar en otra parte,
yo soi contenta de lo qu’escogiste.
No sabrá ella como yo enojarte;
siempre te tractará de una manera
que no sé si será señal de amarte.
Será más estimado, que no fuera
el espíritu tuyo y alabado
más que quando de ti amada hera.
Mas no por essos bienes que ás hallado
en ella, dexará de dar espanto
de ver un coraçón anssí mudado.
No te quiero hablar en esto tanto
porque se huelga el que mal á hecho
de ver quel ofendido bive en llanto.
Tú estás a tu plaçer y satisfecho:
yo seré de amistad muy gran tu amiga,
dexando siempre a salvo mi derecho.
Que no quiero que nadie vea ni diga
la culpa tuya, ni que me ás dexado
de amar en verme que te só enemiga.

                                                Para conmigo quedas disculpado,
porque siempre te tube por mudable,
aunque a veçes me avías engañado;
Para mí es el dolor muy tolerable,
ningún cuidado tengas de mi pena;
afírmate, no seas variable,
Que no puede hallarse cossa buena
con quien haze mudanças cada día,
                                               dexando natural por cossa agena.
Aquesto que te escrivo no querría
que te aga penssar que quedo muerta,
pues más el daño a mí que a ti ofendía.
Que tú saves muy bien qu’es cossa çierta
el que va mill amigos procurando
que jamás amistad no se le açierta.

                                      Yo te prometo que no vea llorando
jamás nadie mis hojos por aquesto,
ni el coraçón por ello sospirando
Ni la color mudada de mi gesto
el dolor que ‘ncubrir el alma suele
hará pareçer claro y manifiesto.
Está seguro que no me desvele,
cuidano de saber cómo te á ido
en este nuevo amor que aora te duele.




Que mil veçes te ás visto tan perdido,
jurando que no amaste ansí en tu bida,
y tú sabes muy bien dónde se an ido.
Mira que pues mereçe ser servida,
que lo sepas hazer sin apartarte,
como heziste de otra tan querida.
Perdóname que quiero aconsejarte
en cossa que consejo no rrequiere
ni seso ni rraçón jamás es parte.
Que conviene seguir lo que amor quiere,
digo quando el amor es verdadero,
que no el amor de quien por todas muere.
Escrivirte de mí nuevas no quiero,
que no las querrás ver de mano mía
ni tampoco de ti yo las espero.
Dios te dé con quien amas alegría,
y a tu coraçón dé contentamiento,
y te guarde de mala frenessía.
Aunque todas tus penas lleva el viento,
pues no son más de quanto estás presente,
qu’en partiendo te apartas de tormento.

No quiero seguir más este açidente
ni quiero declarar tus condiçiones
por no dar qué dezir de ti a la gente.
Digo que ás menester mill coraçones
para sufrir el mal que te procuras
si andas de verdad en tus passiones
o te án de ser contadas por locuras.


 FRANCISCA DE ARAGÓN - Cancionero de poesías varias, Ms. 617 de la Biblioteca Real de Madrid, ed. de J. J. Labrador, C. A. Zorita y R. A. Di Franco, Madrid, Visor, 1994, nº 430, pp. 458-461:

Cancionero sevillano de Toledo. Manuscrito 506 (fondo Borbón- Lorenzana). Biblioteca de Castilla-La Mancha, ed. de J. J. Labrador, C. A. Zorita y R. A. Di Franco, Sevilla: Universidad, 2006, nº 24, pp. 70-71: “Pues aquel gran amor que me tubiste”

     D. Catarina da Áustria, mulher de D. João III, neta dos reis católicos, cheia de devoção, mas muito atormentada pelas práticas da inquisição encantara-se com o espirito, e vividez de D. Francisca, filha do senhor da Quarteira, 5º senhor do Morgado da Quarteira -Nuno Rodrigues Barreto. Alcaide-mor de Faro e Loulé, fronteiro-mor, e vedor da fazenda de toda a província, e Filha de D. Leonor de Milan, e bisneta de D. João II rei de Aragão, a correr-lhe nas veias sangue real espanhol. - É recordada como sobrinha do governador da índia Francisco Barreto entre 1555-1558, Mesmo que se rejeite a ideia de Teófilo Braga, que sempre jogou entre a luz e a sombra, mas esta é a informação que dela nos contam.
         E com razão ou sem ela, lembram-na familiar de Francisco Barreto, Governador da Índia entre 1555 e 1558, que de facto era seu tio, avindo e desavindo de Diogo do Couto, na Década XVI, que diz ter convivido com D. Francisca após da morte de seu marido. Que só poderia ter sido depois de 1571 A realidade é que o poeta não a esqueceu. Os cronistas: João de Barros, Castanheda André Resende e D. Leonor Coutinho condessa da Vidigueira, não a mencionam nos seus documentos a não ser como uma dama de D. Catarina e da Infanta D. Maria.
     Muito estranho que Garcia Resende, quem mais frequentava a corte, quem fornecia letras de música, o que melhor conhecia todos os enredos e intrigas das antecâmaras da corte, onde as damas escreviam os seus diários de memórias, e lhes fez exclamações vagas, como o epigrama de frente aos seus retractos, de D. Francisca só nos deixa a informação de quera loura:
Do crespo ouro que tod’alma prende
Vossa cabeça rodeada seja

Que era branca e rosada:
A purpura formosa, a branca de neve
Que neste rosto amor tem repartido

Que os seus olhos eram claros:
                                 Aqueles vaios claros
Dos seus olhos formosos

O sacudir do corpo:

Algum tempo cuidei que não avia
Nada em vós , nem por vós que não criasse
N’alma brandura, e só contentamento.

Vejo agora que mal s’enganaria
Sem outra cousa de vós esperasse
Senão tristeza e dôr, pena e tormento

     Garcia Resende que esteve tao perto dela, e que pouco a cantou em verso, pouca mais nos resta que uma nota reveladora, a não ser que por entrelinhas insonsas adivinhemos alternativas do nosso agrado ou de desdém com que ele era acolhido por ela.
     Por D Francisca ter sido muito discutida por Camões e Andrade Caminha a rivalidade entre Camonista e o camareiro do infante D. Duarte, estavam descritas e cheias de comentários, conjecturas e interpretações de textos e intrigas literárias palacianas. Andrade enfurecia-se de ciúme com a preferência a Camões. De olhos desconfiados o mesureiro vate, consagrado pela fama, via em Andrade Caminha um moço turbulento.

     Sabemos que, Camões não passava despercebido perante a formusura de uma mulher. Deixava-se cativar pelo seu encanto. Mas a percepção inteligente de D, Francisca soube sempre distinguir tudo o que se movia à sua volta, como todas as mulheres de instinto seguro que o distinguiu simplesmente com admiração pelo seu talento, assim como veio a fazer com Ribaldo frei Ribeiro (chiado) também alcunhado pelo “trinca fortes” que dirigia versos e cartas e requestava ostensivamente as damas.

     Camões, viveu sempre melindrado, arriscando no terreno galanteios a D. Francisca de Aragão, com os seus sentimentos “que não andavam a um só remo” por facilmente se deixar cativar como aconteceu com “Catarina Atalaíde e pela Infanta Maria de Portugal,” que não surpreende.


     Segundo afiança José Maria Rodrigues, - Luiz Vaz de Camões era um poeta educado na veneração do classicismo, grande admirador que servia as regras da etiqueta, manejador de hipérboles, e vezeiro a utilizar a mitologia, e consagrado de fama galanteadora, passou a ser o centro de atenções das damas da corte pertencentes a mais alta esfera da nobreza, pavoneando-se a pregoar as suas rimas perante Francisca de Aragão criando com isso inimizades e ciúmes de outros poetas terem que passar a ser figuras de segundo plano.
     Como era normal, a sua acessibilidade ao paço real fizeram com que alguns olhos desconfiassem …
     Camões não passava despercebido à formusura de D. Francisca de Aragão, - altiva camareira da Rainha D. Catarina, que casou com D. João de Borja, e com quem, por certo, Camões se correspondeu.
     - Era habitual na época os poetas elogiarem a beleza notável de uma mulher, por si ou por outro admirador apaixonado. Com vilancetes, glosas, cantigas, sonetos, epigramas balatas e sextinas, ressaltavam o enlevo amoroso que os poetas fizeram às suas musas inspiradoras!

     Os actos de espirito e a beleza de D. Francisca deixou estupefactos os olhares dos poetas e dos cortesãos, incendiou os corações dos nobres mais ricos, cultos e engenhosos. Inspirou Camões, Andrade caminha, e o seu “doce Jorge Montemor, que a deixou muito lisonjeada ao evoca-la no seu canto de Orfeu! – segundo as palavras de Teófilo Braga
- Desta mulher de celebrada beleza, nenhum testemunho físico nos resta. Mas subsistem vestígios que são história em si mesmos. De facto, fazem-se ouvir vozes, aqui e ali, que a mantêm ligada a Camões pela vida fora e que a dão por perto, mesmo quando ele estanciava na Índia. É no cancioneiro de Andrade Caminha que se podem ler os únicos elogios a D. Francisca de Aragão. 
     Por final, subjugou-se com o prestígio altaneiro do embaixador D. João Borja, filho do cardeal, são Francesco de Borja, dos mais conceituados homens ricos de Castela, numa altura em que terminara o enlace de D. Francisca e D. Duarte, neto de D. Manuel de Portugal.


 - Podemos dizer que D. Francisca atravessou uma das épocas mais curiosas do seculo XVI, em que a historia nos conta episódios das epopeias de heróis, narrativas de gloriosos, e ecos das seroes palacianas, joaninos, manuelinos; a maior popularidade da cultura portuguesa nunca anteriormente alcançada.  A obra das lusíadas de Luís Vaz de Camões está cheia de vozes sobre Francisca de Aragão, o que faz com que ela seja uma importante ressonância nas memórias camonianas.

     A mudança de D. Francisca foi abrupta. A vida tranquila das paisagens da serra de Monchique, dos figueirais, das amendoeiras floridas a perfumar as primaveras para a tumultuosa cidade de lisboa mal cheirosa, que se fazia circular nas galerias, salas e varandas do Paço. Foi um flagrante contraste entre a simplicidade do viver num palácio rustico e o fervilhar de gente da corte animada com a sociedade intelectual, de capitães, navegadores, cronistas, poetas, eclesiásticos, embaixadores e família real.
     D. catarina - na sua época em pleno renascimento cuidou dos estudos eruditos e das cogitações teológicas e filosóficas ao lado de sua sobrinha Infanta D. Maria, Luiza Sigea e muitas outras onde fazia parte D. Francisca de Aragão.
     Criou a escola “ fina da galanteria” de onde saíram “mestres da frívola arte de agradar” com o romantismo a representar os graciosos dramas de amor com a prodigalidade de alegorias metafisicas, a servir a passa tempo da aristocracia portuguesa.
     As tardes da primavera e de verão tornaram-se teatros áulicos de aventuras, inventavam-se jogos engenhosos ou motes glosados com os versos do cancioneiro de Resende, do Sá Miranda e de Camões
Os jardins dos palácios, eram autênticos centros intelectuais, como verdadeiras academias. O palácio do infante D. Duarte, da infanta D. Maria, do duque de Aveiro, e dos condes do redondo, Vimioso, linhares e sortelha, entremeavam-se derradeiras representações dos autos de Gil vicente, pecas de Luiz Vaz de Camões, que alguém chamou com acerto: -escola fina da galanteria.

        Consta-se em alguns ditos e tradições que, as festas portuguesas eram assíduas por gente do outro lado da fronteira como o conde de Alba, e a filha do duque de Vilahermosa, que deixou o convento onde professava como freira para se refugiar no centro da aristocracia portuguesa. O pedido da monarquia espanhola e por seu pai, pressionando a sua expulsão ao rei D. Sebastião, que pelo que se consta, apaixonou-se pela formosa freira, que a deu como desaparecida. Pensa-se que viveu com novo nome no meio da sociedade nobre portuguesa.
     O paço real da ribeira, o palácio de Vila Viçosa, eram centros requintados de luxo e preciosismo que, desabrocharam a “ flor da graça” a elegância da cultura, que consagrou a beleza pela vivacidade das suas réplicas e altivez das maneiras, o encanto que o país nunca tinha vivido.
     As festas intimam com concertos de música com instrumentos tangidos pelos melhores músicos, entre eles. Paula Vicente, acompanhando cantigas vilancetes, éclogas, elegias ou chistes. Pelos mesmos salões, passavam vários pares de leve a dançarem com o langor arrastado ou com a graciosa denguice. As refeições eram acompanhadas com espectáculos dos bobos gracejadores sacudindo as corcundas a desencadear o bom humor dos convidados sentados à mesa.

     Pelo que se consta D. Francisca de natureza maleável adaptou-se ao meio requintado de forma mimosa com todos os intervenientes da alta sociedade, tornando-se a dama preferia de D. Catarina. E, que a descreve: «mulher rígida, e com a disposição de bondade, com o destino a fazer padecer de muito sangrar com a morte sucessiva dos seus novos filhos. Quando depois de viúva e senhora do poder, revela firmeza no seu pulso com qualidades sólidas a governar com a colaboração de Pires de Távora».

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