quarta-feira, 11 de maio de 2022

A toponímia must’arab / Moçárabe

 

A toponímia must’arab atesta esta convivência, que se prolongou muito para além das datas comummente definidas como balizas históricas, pois estas populações continuaram entre nós, numa frutuosa coexistência, muito depois de 1249 (conquista do Algarve) ou de 1496 (édito de expulsão dos judeus de Portugal).

Devoção entre os moçárabes, São Félix, Santo Adrião e Santa Natália,

https://stringfixer.com/pt/Mozarabic_rite

Assim, os cristãos moçárabes puderam venerar os seus santos (Santa Maria, S.

Vicente, S. Brás, S. Cucufate, S. Sisenando, S. Manços, Santa Iria, S. Paio, S.

Mamede…),

 

A única liturgia moçárabe referida na Sé Velha de Coimbra, onde, em certas ocasiões, se celebra missa no rito hispânico. (Coimbra, Lorvão, Vacariça, Anadia, Lafões, )

as comunidades falavam, na sua maioria,  idiomas românicos tradicionais e, simultaneamente, o árabe

Mesmo depois  da Reconquista, os milhares de árabes que viviam na península ficaram entre nós, uns como escravos, outros como forros ou livres.

D. Afonso Henriques deu carta de fidelitatis et firmitudinis às comunidades de Lisboa, Almada, Palmela e Alcácer do Sal.

: a partir do reinado de D. Pedro I, os

Mouros continuaram a residir na periferia das cidades, nas cerca de vinte mourarias ou aljamas, de que há notícia nos séculos XIV e XV.

a longa convivência tornou inevitável a entrada de numerosos arabismos na língua portuguesa, calculando-se que constituam cerca de 8% do nosso léxico.

Porta moçárabe, no interior do antigo mosteiro de S. Jorge de Milreus (1084), em Coimbra

técnicas do tijolo na construção das paredes;  ; os arcos de ferradura, os ogivados e os de “pleno cintro”;

janelas geminadas ou de ajimez;

Pavimentos de tijolo e / ou de azulejo;

 

Telhas vidradas e polícromas de inspiração oriental; - impossível

Ornamentação baseada em motivos florais estilizados e geométricos;

 Tectos de madeira concebidos segundo a técnica do alfarge:  lavor de alfarge, também denominado almoçárabe, dominou, aliás, toda a arte decorativa de interiores em Portugal, desde a conquista árabe até ao primeiro terço do Século XVIII.

Alarifes mouros, ou inscrição (já pouco nítida) nas paredes das igrejas.

 

 A instabilidade político-social e o clima de guerra civil que se vivia terá até levado algumas figuras proeminentes da sociedade goda a encorajar os Árabes a entrarem na Península. Alguns autores consideram que não terá havido “conquista da Al-Andalus (Hispânia) mas uma ocupação, conseguida com base na entrega espontânea das terras por visigodos no acordo motivado, pela vitalidade inovadora da civilização muçulmana. a debilidade e a falta de coesão do    estado visigodo-

Assim, na Hispânia, passaram a coexistir cinco grupos etnicossociais: os baladiyym, provenientes da Arábia, senhores da Ibéria e do norte de África;

 Mouros ou berberes da Mauritânia, parcialmente islamizados pelos árabes

Os muwalladim [muladis],  

 “ must’arab ou mustarib, ou submetido aos árabes, arabizado”; Hispano-godos ou hispano-romanos submetidos ao domínio muçulmano que viviam em comunidades separadas e dispunham de instituições e autoridades próprias.  os judeus, com os mesmos direitos que os moçárabes.

 

 Topónimos moçárabes que se relacionam com as características do terreno

Disseminados um pouco por toda a toponímia portuguesa, Arneiro(s), Arnado, Arnal, Arnela(s) e Arnosa (além de inúmeros compostos) são nomes de lugar.

Continuadores e derivados do latim ARENA ‘areia’, que também conservam -Nintervocálico, ao contrário das formas galego-portuguesas areia, areal, areeiro,

areosa…, também muito frequentes entre nós.

      Moçárabes (de musta’rab que significa “arabizados”), ou (entre os árabes), que são cristãos hispano-visigótica que viviam  em Al-Andalus,   adaptados a  alguns costumes árabes sem se converter ao islamismo, territórios conquistados pelos muçulmanos misturava-se com os muçulmanos no período que compreende desde a invasão árabe da Península Ibérica (711) até ao final do século XI.

( dom Juan Miguel Ferrer Grenesche, vigário-geral da Arquidiocese de Toledo,  especialista em rito moçárabe.)

Particularmente na região do antigo reino visigodo de Toledo. Povo com   uma liturgia  que nasceu no século IV, na península ibérica com o antigo reino visigodo de Toledo  com seu riquíssimo património.  chegou ao  nosso tempo.

 Podemos imaginar,  porém, que os Muçulmanos de  início não puderam influenciar os costumes e as crenças musta’rab, pois eram uma minoria militar e política e se limitavam a manter a situação sob controle.

Alguns cristãos de origem visigótica, não convertidos ao catolicismo pensaram em converterem-se ao arianismo fazendo-se muçulmanos. Quanto às  tentativas de converter os muçulmanos ao cristianismo, foi  uma    provocação.

  A interrogação está na  reforma gregoriana. Seria o fim do rito moçárabe  , em favor do rito romano?

    Mosteiro moçárabe de San Miguel Escalada levantado em 913 no lugar de uma pequena capela visigótica. a planta  e basilical , de três naves – inspirada em  igrejas pré-romântica . o ambiente é  muçulmano requintado – colunas e arquivoltas de  pedras , molduras de estuque , capiteis  e ornatos das arquitraves. As paredes e ladrilho de pedra em arquitectura moçárabe-muçulmano num  átrio isolado -  espaço  sagrado, distanciado de  uma aldeia de taipa com o reboco  barro  calcado com palha a descobrir-se sob ardência da luz intensa do sol, transformado em tom dourado.

     O Mosteiro de San Miguel de Escalada é um mosteiro espanhol que se localiza no Caminho de Santiago, relativamente perto da cidade de Leão, na província de mesmo nome, e do qual hoje apenas resta uma igreja.

     Em 973 o bispo de Astorga fez erguer numa aldeia perdida dos arredores de Ponferrada o templo de santiago de Penalva no meio da rusticidade de uma montanha com paredes de pedra solta que, contrastam com as colunas, arcos de ferradura e rendilhados ornados de estuque. As colunas são de rocha metamórfica do arcaísmo, extraídas das pedreiras locais.  

 Os monges de rito romano começaram, assim, a estabelecer-se na Espanha sob a protecção dos reis, e por isso os dois ritos, romano e moçárabe, passaram a conviver. Isso até o já citado Concílio de Burgos, de 1080, em que, sob a direcção da coroa de Castela, que com Aragão retomavam territórios dos árabes. Afonso VI, em 1085 expulsando os árabes.

 Fonte dos Alfanados (Viana do Castelo), Fanadia (Leiria), Vale Fanado (Beja) e Fanates (Coimbra) são alguns dos muitos topónimos relacionados com FANU ‘templo’ e com o verbo fanar, do latim FANARE ‘consagrar’, que, por influência hebraica, evoluiu semanticamente para ‘circuncidar’ e daí para ‘castrar, amputar’ —, sentido em que o verbo foi já usado por Fernão Lopes: «…mamdou tomar huus seis ou sete Portugueeses (…) e mandouhos todos deçepar das maãos e fanar dos narizes…»

(Crónica de D. João I, parte I, p. 382).

 

 qasr ‘fortaleza, palácio’,

Alenquer - topónimos híbridos em que o artigo árabe é anteposto ao nome latino, IUNCARIU ‘juncal’, locativo que, na época proto-histórica, se revestiria da forma iunquerio.

Tejo, do latim TAGU, terá evoluído, nos dialetos moçárabes, para *Tajo e Tejo,

Alvalade influência do árabe al-balat ‘zona plana, chão’.

Grândola, do latim GLANDULA, diminutivo de GLANDE

 Latina PALATIU ‘palácio’,

PINU ‘pinheiro’

Espichel (Setúbal), nome derivado de *espiche / espicho — Originário do cruzamento do latim SPECULA ‘atalaia’ e SPECULU ‘espelho’.

São Brás de Alportel - PORTELLU, diminutivo de PORTU ‘abertura, passagem entrada de um porto.

‘bouça; mata de carvalhos jovens’:-  Carvalhosa

Alcolombal e Columbeira - ‘pombal’ (pomba)

Calveiras, Calvaria(s)  Calves, Quinta de Calvel -  lugares de pouca vegetação,  tal como sucede com a forma popular covo ‘lugar sem vegetação’

Alcácer, Alcaçarias,  e Cacela   são topónimos românicos arabizados. veiculado pelo árabe qastallâ, deriva do latim CASTELLU

Alandroal e Barranco da Alandroeira assentam no nome da planta loendro (LORANDRU), a que se aglutinou a(l).  a denominação dos lugares onde abundam os alandros (‘arbustos ornamentais conhecidos por cevadilha’)

Feliteira, Feiteira, Feitos e  Feitoso - testemunham a abundância de fetos no nosso território.

Carapinha(s), Carapelhos, Carapinheira, Carapinhal  - *CARPA / CARPINUS ‘espécie botânica arbustiva / arbórea’.

Alpendrada (Setúbal) e Alpendurada(s) - morfologia inclinada dos terrenos.

Sine (s), Messines SINU ‘curva, concavidade, baía’.

Moreno (s) deriva do  latim MAURU ‘habitante da Mauritânia ( Mouro)

Espadana (s), Espadanal – derivam da planta   SPATHA -‘espátula; espada’, reportando-se, provavelmente, à planta cujas folhas estreitas e compridas se assemelham a uma espada.

Quando, em Abril ou maio de 711, Tarique atravessou o estreito de Gibraltar e desembarcou no promontório do Calpe, D. Rodrigo, o último dos reis godos reinava na Península Ibéria -  Al-Andalus –( nome que os árabes davam) e  três anos depois  passou para a posse dos   árabes .

“A debilidade, a falta de coesão por parte do estado visigodo, e a instabilidade político-social e o clima de guerra civil que se vivia terá até levado algumas figuras proeminentes da sociedade goda a encorajar os árabes a entrarem na Península. Alguns autores consideram mesmo que não terá havido uma “conquista” árabe, mas uma ocupação espontânea à civilização muçulmana. “

      Hispânia, passou a pertencer a cinco povos étnico-sociais: baladiyym, provenientes da Arábia; berberes da Mauritânia, parcialmente islamizados; os muwalladim [muladis], hispano-godos convertidos ao islamismo.

 

     Os judeus e os moçárabes (must’arab ou mustarib, que significa ‘submetido aos árabes, arabizado) com direitos específicos regidos pela comunidade árabe. Hispano-godos também submetidos ao domínio muçulmano, mas não assimilados. Viviam em comunidades separadas e dispunham de instituições e autoridades próprias. Os descendentes dessas populações homogéneas continuaram a viver em Al-Andalus muito depois de 1249 (conquista do Algarve) ou de 1496 (édito de expulsão dos judeus de Portugal).

     Mouros e sarracenos, Os topónimos de algumas vilas e aldeias com grandes comunidades são testemunhadas a presença de norte a sul do país:

Vilar de Mouros (Caminha), Eira dos Mouros(Monção), Mourosas (Cinfães), São Martinho de Mouros (Resende), Meda de Mouros (Tábua), Cova dos Mouros (Palmela), Horta dos Mouros (Almodôvar), Azinhal dos Mouros, Esteval de Mouros (Loulé), Cerro dos Mouros (Silves), Presa dos Mouros (Lagoa), Moura, Cabeço da Moura (Tomar), Mourão, Mouraria (Caldas da Rainha, Albufeira), Vale de Moura (Évora, Santarém), São Pedro de Sarracenos (Bragança), Serrazim (Vila Verde), Serrazina (Oliveira de Azeméis, Condeixa-a-Nova) …

     A “pegada” dos mollites, ou seja, dos muladis está igualmente marcada nos nossos nomes de lugar: Moldes (Arouca, Paredes de Coura, São Pedro do Sul, Viana do Castelo, Vila do Conde, Vila Nova de Famalicão), Cela de Moldes (Arouca) e Torre deMoldes (Barcelos).

      Os judeus nos legaram vários topónimos: Judeu (Loulé), Malhada do Judeu (Faro), Malhada dos Judeus (Moura), Monte do Judeu (Moura, Serpa, Fronteira), Monte dos Judeus (Arronches, Castelo Branco), Porto Judeu (Penela, Monchique), Vale de Judeus (Setúbal), Vale Judeu (Loulé), etc.

a presença das populações moçárabes está ainda assinalada na toponímia —Casal da Monservia (Loures), Casal de Monservia (Sintra), Moçarria (Santarém), Monçaravia (Alenquer), Monsarros, Vila Nova de Monsarros (Anadia), Monte de Monçarves (Viana do Alentejo) — e na antroponímia antiga: Maria Mozaraba, Petrus Mosarabe (1167), Dominicus Mozaravinus (1232).

Toponímia testemunha a presença de mouros  em Meda de Mouros (Tábua),

A “pegada” dos   muladis em São Pedro do Sul

 

E a presença das populações moçárabes está ainda assinalada na toponímia — Casal da Monservia (Loures), Casal de Monservia (Sintra), Moçarria (Santarém), Monçaravia (Alenquer), Monsarros, Vila Nova de Monsarros (Anadia), Monte de

Monçarves (Viana do Alentejo) — e na antroponímia antiga: Maria Mozaraba, Petrus Mosarabe (1167), Dominicus Mozaravinus (1232).

Alandroal – planta loendro  que se aglutinou a(l)

Alandros ‘arbustos ornamentais conhecidos por cevadilha’.  qasr ‘fortaleza, palácio’.

O latim  Altariu ‘altar; elevação onde se fazem sacrifícios’ é continuado, na

 Toponímia, do galego-português outeiro, que contrasta com a forma moçárabe alter, presente em Alter do Chão e em Alter Pedroso (Portalegre), onde se verifica aimela, passagem de [a] tónico a [e], bem como a apócope da vogal final.

Alvalade  -  topónimos híbridos, documentados a partir de 933: Albalat, Alualad, Alualati. Campo de Alvalade Grande e Campo de Alvalade Pequeno

Carapinha (s), Carapelhos, Carapinheira, Carapinhal e Carapeto(s)-

espécie botânica arbustiva / arbórea’. Anaptixe de [a], amplamente documentada em fontes moçárabes, onde é bastante frequente o aparecimento de uma vogal entre consoantes.

Qastallâ, deriva do latim Castellu

 Cabo Espichel (Setúbal), nome derivado de *espiche / espicho

Pax Julia dos romanos era vulgarmente conhecida por Pace,

TAGU, terá evoluído, nos dialetos moçárabes, para *Tajo e depois Tejo,

Brejo - *Bragu ‘terreno pantanoso, alagadiço’, de origem celta. documenta-se desde 1176

Benavente - é um nome que continua Aventi, o genitivo do nome próprio românico Aventus, ao qual se aglutinou o náçabe árabe ben.

 Viegas – nome romanizado  Egas , (corte de  espada’), também se aglutinou o náçabe árabe ben.  Uegas (1278)

Pai Viegas - Paio <- Pelaio – PELAGIU

Monte Aiseque, numa inquirição de D. Afonso III —

Monchique - está também presente atípica terminação moçárabe -ique.

 Ourique - nomes de lugar -radica no genitivo do antropónimo godo Auricus com  as formas antigas Oric, Ouric, Ourich, Aurich e Aulich)

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